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A secreção fisiológica de insulina consiste em dois componentes: a liberação de insulina basal constante, para manter os níveis de glicose no período interprandial, e a insulina secretada em resposta aos alimentos, com finalidade de controlar a glicemia pós-prandial. A insulinoterapia tenta reproduzir a secreção fisiológica das células β pancreáticas tanto quanto possível.

A imagem abaixo traz detalhes das características farmacocinéticas das diferentes insulinas e análogos disponíveis atualmente no Brasil.

 

Fonte da imagem: Sociedade Brasileira de Diabetes. Visão geral das insulinas de ação ultralonga.

A insulina NPH tem um pico distinto e variável. Em geral, é necessário injetá-la duas vezes ao dia para assegurar níveis de insulina suficientes ao longo das 24 horas.

Os análogos de insulina são insulinas sintéticas com pequenas mudanças na sequência de aminoácidos feitas com o objetivo de gerar um perfil farmacológico mais parecido com o da insulina endógena. Além da vantagem da aplicação única diária, parecem estar associados a uma modesta redução no risco de hipoglicemia noturna quando comparados com a insulina NPH.

Apesar disto, metanálises mostram pouca evidência de outros benefícios dos análogos basais de insulina, como redução da hipoglicemia grave ou melhora no controle glicêmico em pacientes com DM2. Sendo assim, o valor do uso de análogos basais na linha de frente para DM2 não é claro.

A abordagem terapêutica com insulina é variável e deve levar em consideração fatores como nível de controle glicêmico, estilo de vida, preferências individuais, e até o poder aquisitivo de cada paciente, visto que os custos dos análogos de insulina basal podem ser até dez vezes mais altos que os da insulina NPH. Apesar disso, os análogos da insulina têm sido cada vez mais prescritos.

Este tema tem recebido muita atenção, já que preços elevados podem levar a consequências como não adesão e não-persistência, ou seja, descontinuidade prematura das terapias prescritas, representando um importante problema com impacto no controle da doença.

Sendo assim, é necessário disponibilizar evidências de alta qualidade que permitam comparar análogos basais de insulina com a insulina NPH para o paciente com DM2 no contexto da prática clínica diária, já que para justificar seu alto custo, os benefícios clínicos dos análogos basais de insulina devem ser claros e convincentes.

Para isso, os autores de um artigo publicado recentemente no JAMA realizaram um estudo observacional retrospectivo de 25.489 pacientes com DM2 de um grande sistema integrado de saúde, com o objetivo de comparar:

1) Taxas de visitas ao departamento de emergência (DE) ou internações hospitalares relacionadas à hipoglicemia, associadas ao início de análogos de insulina de ação prolongada (Glargina ou Detemir) versus insulina NPH, em pacientes com DM2 (desfecho primário).

2) Alteração nos níveis de hemoglobina A1c dentro de um ano após o início de análogos da insulina basal (n = 1.928) ou insulina NPH (n = 23.561) entre 2006 e 2015 (desfecho secundário).

Os autores concluíram que entre os pacientes com DM2, o início de um análogo em comparação com a insulina NPH não esteve associado a um risco reduzido de consultas ou internamentos hospitalares relacionados à hipoglicemia, e nem mesmo à melhora do controle glicêmico.

Esses achados sugerem que o uso de análogos basais de insulina pode não estar associado a vantagens clínicas para esses desfechos na prática clínica diária.

Os autores citam algumas limitações do estudo, como:

– O resultado primário foi baseado em atendimentos hospitalares relacionados à hipoglicemia, e, portanto, as diferenças na hipoglicemia noturna autorrelatada ou eventos adversos tratados por serviços médicos de emergência, mas não transportados para o hospital, não puderam ser avaliados.

-Os pacientes do estudo foram atendidos em um sistema integrado de cuidados à saúde, o que pode não ser generalizável para outros tipos de configurações de cuidados à saúde.

– As comparações entre insulina NPH e análogos de insulina basal não incluíram a conveniência ou número de injeções diárias. É possível que os análogos de insulina possam conferir essas e outras vantagens para pacientes com DM2.

– Esta análise centrou-se no início da insulina basal em pacientes com DM2 mal controlado (média de HbA1c foi de 9,4% no início do estudo), portanto os resultados não podem ser generalizados para outras populações com DM2 melhor controlado, pacientes com diabetes tipo 1, ou aqueles que usam regimes complexos de insulina basal-prandial.

Os autores concluem discutindo o fato de que é provável que alguns subgrupos de pacientes apresentem melhores resultados clínicos e econômicos com insulina NPH, enquanto outros podem se adaptar melhor aos análogos de insulina basal.

Análises futuras com amostras maiores devem explorar a heterogeneidade nas respostas dos pacientes aos diferentes tipos de insulina, pois o estudo atual não foi desenhado para avaliar essas diferenças entre os subgrupos de pacientes.

Novos análogos basais de insulina, ainda mais caros, estão sendo promovidos apesar de seus menores benefícios absolutos em comparação com as atuais opções amplamente utilizadas, então questões sobre os custos do tratamento versus reais benefícios devem continuar sendo motivo de debates.

 

Referências:

1. Association of Initiation of Basal Insulin Analogs vs Neutral Protamine Hagedorn Insulin With Hypoglycemia-Related Emergency Department Visits or Hospital Admissions and With Glycemic Control in Patients With Type 2 Diabetes. Kasia J. Lipska et al. JAMA 2018.

2. Revisiting NPH Insulin for Type 2 Diabetes. Is a Step Back the Path Forward? Editorial. JAMA 2018.

3. E-BBOK 2.O – Diabetes na prática clínica: Visão geral e perfis de açãodas insulinas e análogos de insulina. Soc. Bras. de Diabetes.

4. Diretrizes da Sociedade Brasileira de Diabetes 2017-2018.

5. Site da Soc. Bras. de Diabetes. Visão geral das insulinas de ação ultralonga. Por Dr.Augusto Pimazoni-Netto.